Variedades


A realidade dos surdos no Brasil e o direito à educação

         Conviver com uma deficiência sensorial deve ser um desafio tremendo. Logo que pensamos nos indivíduos surdos, imaginamos uma série de dificuldades e limitações com as quais eles têm de conviver. Porém, ao analisarmos de uma maneira mais abrangente, todos nós possuímos limitações, afinal somos seres humanos. O homem, ao longo do tempo, criou diversos mecanismos para conviver com as chamadas “limitações”: não podemos voar, mas subimos milhares de pés de altura em um avião; não podemos respirar debaixo da água, mas vamos a mil metros de profundidade utilizando-se de um submarino; corremos a uma velocidade ínfima, mas conseguimos construir carros que correm a centenas de quilômetros por hora. Enfim, todos somos seres humanos e, mesmo possuindo os cinco sentidos perfeitos (olfato, visão, paladar, audição e tato), temos de conviver com muitas limitações.
              Do mesmo modo que os ouvintes se adaptaram às suas limitações ao longo do tempo, os indivíduos surdos o fizeram: eles não podem ouvir (ou têm dificuldade para isso), mas possuem sua Língua própria (no caso do Brasil, a Libras – Língua brasileira de sinais). Além disso, desenvolveram, conforme suas necessidades, uma cultura riquíssima, adaptada para a sua realidade: criaram adaptações de histórias infantis, nas quais os protagonistas são surdos (Rapunzel surda, Cinderela surda etc.); adaptaram objetos úteis no dia a dia, como a campainha (para os surdos, o sistema funciona com uma luz, indicando que alguém está à porta de casa) e a babá eletrônica (aparelho vibratório que alerta quando a criança acorda, por exemplo, permitindo que a mãe surda realize outras atividades enquanto o bebê dorme); modificaram determinadas brincadeiras, a fim de atender às suas necessidades; dentre outros. Um aspecto curioso a ser levado em consideração é o fato de os surdos dançarem e apreciarem músicas como qualquer outra pessoa. Com relação a isso, expõe Dean Shibata, professor de radiologia na Universidade de Washington, que elaborou um estudo sobre o assunto: “Os indivíduos com deficiências auditivas sentem a música através de vibrações; a percepção destas vibrações musicais é tão real como o seu equivalente sonoro, por serem ambos processados na mesma região do cérebro.”
             Com tudo isso, percebemos o quão longe os surdos podem chegar, o que torna completamente equivocada aquela noção de que os surdos têm desenvolvimento intelectual afetado, um mito muito comum na nossa sociedade. Não devemos confundir domínio da linguagem oral com domínio de pensamento.
                Infelizmente, a educação dos surdos no Brasil é bastante precária. Eles vêm encontrando bastantes dificuldades para se integrarem nas turmas regulares, pois faltam, no geral, medidas de inclusão de fato, que facilitem a vida do surdo e permita que ele possa obter o conhecimento da melhor maneira possível. Afirma o Decreto nº 5626, de 22 de dezembro de 2005, em seu art. 22: “As instituições federais de ensino responsáveis pela educação básica devem garantir a inclusão de alunos surdos ou com deficiência auditiva, por meio da organização de: I - escolas e classes de educação bilíngüe, abertas a alunos surdos e ouvintes, com professores bilíngües, na educação infantil e nos anos iniciais do ensino fundamental.” Infelizmente, os surdos muitas vezes se veem excluídos da sala de aula, não havendo os requisitos fundamentais para que eles possam desenvolver um aprendizado de qualidade.
                Um intérprete de Libras, em uma sala de aula dita inclusiva, é de fundamental importância, pois ele é o principal responsável por unir os dois “mundos”, o dos ouvintes e o dos surdos, facilitando para os últimos uma aprendizagem de qualidade. Nas salas de aula, infelizmente, os intérpretes muitas vezes não cumprem o papel deles de forma coerente, não dando atenção total aos surdos, traduzindo somente em partes o que é passado na aula. Além disso, muitos surdos acabam ficando dispersos, excluindo-se do processo de aprendizagem.
                É muito importante, por fim, que possamos conhecer um pouco mais sobre a cultura surda e tentar entrar em contato com eles. A Língua brasileira de sinais (Libras) é um instrumento muito importante para os surdos, devendo ser utilizada desde o momento em que se descobre a deficiência. Devemos alertar às pessoas sobre a não utilização da oralização (em que se dá prioridade à leitura labial, a fim de que o surdo possa tentar falar), pois esse sistema é bastante ineficaz, em que tenta simplesmente adaptar o surdo à nossa realidade, e não dá a eles o pleno processo de comunicação. Além disso, devemos cobrar das autoridades uma maior fiscalização com relação às turmas chamadas “inclusivas”, a fim de que os surdos possam ter a educação adequada, que tanto lhes é assegurada na legislação.
                                                                                     
Leandro Targino.
Fortaleza - CE.
Graduando em Direito pela Universidade Federal do Ceará.